Todo dia ele acordava cedo e esquentava a água do café. E do
canto da sala tirava uma gaiola com um coleirinho. Caminhava até a varanda,
onde pendurava a gaiola no alto, num cantinho banhado pelos primeiros raios de
sol da manhã. O coleirinho, um pássaro bem pequenino e delicado, começava a
cantar. Batendo as asas, parecia feliz. Daí, os dois assobiavam juntos como se
numa conversa de velhos amigos. O homem começava, o pássaro respondia e
vice-versa. Ficavam assim por um tempo. Nas manhãs de chuva, o homem escolhia outro
canto da varanda, num local mais confortável para o amiguinho de asas. E numa
rotina metódica, guardava a gaiola dentro de casa assim que voltava do
trabalho.
Foi assim por anos, até que os dois envelheceram. E, olha que
no meio desse caminho muitas coisas aconteceram. O tempo sempre muda alguma
coisinha mínima que seja. Mas, os dois continuavam juntos, até que um dia o
homem adoeceu e como quem faz uma viagem longa, partiu. A primeira pessoa
que sentiu, é claro, foi o coleirinho. Ninguém mais ligava pra ele, ele perdera o seu
grande amigo e companheiro. Passou um tempo e ele, entristecido, parou
de cantar. Só ficava quietinho no canto dele. Foi assim, por pouco tempo...
Até que numa manhã de chuva o coleirinho se encolheu no seu
cantinho e dormiu...
Até que numa manhã de sol, o vento derrubou a gaiola,
abrindo sua porteirazinha e o passarinho bateu asas e voou, voou pra longe, pra
longe do frio, longe do silêncio, e foi cantar em algum lugar, junto daquele
velho amigo.